
Reencontrei uma revista antiga, janeiro de 2008, Mick Fanning na capa, recem conquistado seu primeiro titulo mundial. Tenho por habito ler o editorial logo que abro a revista. Editoriais são uma especie de termometro do que voce vai encontrar la dentro. Bons editoriais falam de coisas bobas que fazem parte do cotidiano do leitor comum e mal se referem ao conteudo da revista - pra isso ja temos o indice. Desde que comecei a ler com interesse essa correspondencia do editor com o leitor, pouca gente chegou perto do Steve Hawk, editor da Surfer nos anos 90. Ultimamente aqui no Brasil editores sem muito recurso usam tão valioso espaço para apenas auto-celebrar a propria publicação, infantil e inocente como a satisfação dum aluno de 11 anos ao entregar o primeiro numero do jornal da classe ao professor. Enumerar os assuntos que o leitor vai encontrar dentro da revista é tratar o leitor como imbecil, leva-lo pela mão apontando para as dificuldades de fazer uma revista mensal é subestimar violentamente a capacidade cognitiva do seu publico alvo. Falava eu do primeiro titulo do Mick Fanning e desviei do assunto. O tradicional Tracks, jornal que virou revista australiano, trazia tudo sobre o primeiro titulo mundial do Fanning e o editor Sean Doherty, autor de meia duzia de bons livros sobre surfe e surfistas, como a biografia do Michael Peterson, escrevia com otimismo sobre o suposto primeiro (para ele) duma serie de quatro titulos do Eugene. A euforia do titulo ter voltado para Australia depois de 8 anos (desde Occy em 99) era tanta, que toda aquela edição indicava que havia de fato um renascimento do espirito campeão australiano, seria naturalmente seguido por Parko e Taj, e mais uma vez apostando no suposto enfraquecimento do Careca e Andy na corrida ao caneco. Achei curioso e parei pra pensar nos numeros. Fanning foi campeão pela primeira vez com a mesma idade que Mark Richards, o grande campeão australiano, se aposentava do surfe profissional, 26 anos. Fanning, o fenomeno, só não era mais velho do que dois dos 17 campeões mundiais, Occy e Derek Ho, uma façanha um pouco tardia, pensei eu. Tinha toda razão a revista em celebrar o feito, afinal de contas Slater e Irons tornaram o titulo em si numa coisa meio ordinaria, a ser realizada a toda hora, Irons com seus tres titulos e Slater, então com 8. A latinha avermelhada de felicidade do Fanning com seus cabelos dourados estampava a capa e as pequenas manchetes provocavam o leitor, A entrevista, A festa, A analise, A conquista, veja tudo la dentro. Em 2008, Slater competiu em velocidade cruzeiro, nem tomou conhecimento da retomada australiana e Fanning, na ressaca do seu triunfo, terminou apenas em oitavo lugar, atras do Mineiro e Ace Buchan. 2009 foi a vez do Slater descansar e Parko tinha o titulo nas mãos até o meio do ano. Fanning, 28 aninhos, despertou do seu torpor e atropelou todo mundo na caça do seu segundo titulo. Com 28 anos Slater ja tinha se afastado das competições com seis coroas na sacola e sequer aparecia no ranking nos dois ultimos anos. Eis o que quero dizer, tirando Jordy e Mineiro (eventualmente Owen ou Dane num surto)não há ninguem no tour com menos de 30 anos que ameace o decimo primeiro do Careca. E ca entre nos, isso é ao mesmo tempo lamentavel e fascinante. Lamentavel, porque revela o quão fragil são os adversarios do KS10 diante de tamanha excelencia e fascinante porque torcemos todos sempre pelos mais fracos, esteja ele onde estiver. Nesse ano, 2011, Fanning completa seu decimo ano no circuito entre os 34 (antes 44), Parko seu 11º e Taj vai para sua 14ª temporada, isso sem contar os anos de WQS. É tempo demais na expectativa. Pouca gente aguenta a pressão que é não vencer. Por mais que se propague o discurso que acima de tudo esta a diversão e a sorte de poder ganhar a vida pegando onda, por tras disso tudo tem uma montanha de frustração que come essa gente por dentro. Taj Burrow mesmo, que agora desfruta de mais um momento exuberante na sua carreira, como foi no inicio do ano passado e em 2007, ano da redenção do Fanning, ja viu seu mundo esmagado pela conquista alheia. Quando se chega ao nivel de disputar o topo do ranking, qualquer resultado é pifio senão o primeiro. O afastamento momentaneo do Mineiro dos top 5 e o fato de, tão novo, já ser um veterano no circuito pode funcionar ao seu favor. Afinal de contas, Mineiro tem apenas 24 anos. Me afastei novamente do asunto, refletindo sobre as possibilidades que se criam quando se remexe no passado olhando pro futuro. O que parecia tão certo em 2007, apenas 4 anos atras, dominio australiano, declinio do Slater e uma nova era anunciada, não passava de um soluço. O Careca não vai a lugar algum tão cedo, tudo indica. Em 2012 ele completa 40 anos e o desafio de ganhar o circuito com essa idade pode ser uma grande motivação...
