
-Querida, ligue para o Formiga e diga que hoje não dirijo pra ninguem.-
A sensação de estranheza ao ver Herbie Fletcher dropar uma onda média com seu jet ski em Waimea no filme Amazing surf stories em 1987 era incômoda.
Já tinha lido sobre as proezas do irmão do Wes Laine, Randy, e seu cavalo marinho motorizado, mas um surfista respeitado e inovador como Herbie, que ainda por cima nos presenteava com os empolgantes vídeos da série ‘Wave Warriors’, primeira geração de filmes de surfe para assistir em casa, Herbie, dizia eu, legitimava uma aparente ‘nova’ modalidade de se divertir nas ondas.
Ninguem dava um centavo por aquilo, o purismo falava bem mais alto e a única concessão seria usar o automóvel em salvamentos.
Brock Little não precisava de motor para colocar o pescoço na ponta da guilhotina- fazia por prazer, no braço, no peito.
Já escrevi que surfe é provavelmente o esporte mais humilhante que jamais existiu.
Um sujeito que resolve aprender a surfar com mais de 20 anos de idade vai demorar outros 20 para ser considerado um surfista mediano – isso, no caso de ser extraordinariamente talentoso, caso contrário, mais 20.
No jiu-jitsu, por exemplo, qualquer Zé ninguem depois de 3 ou 4 anos já alcança determinada graduação que impõe respeito, debaixo de treinamento sério e trabalho duro.
No surfe não faz a menor diferença se voce dedica 12 horas diárias do seu tempo para estudar ondas e treinar com sua prancha – o surfe é imperdoavelmente humilhante, repito redundante como um jornalista que escreve press-releases.
Não há saídas faceis no surfe.
Exceto o surfe rebocado.

- Um caso raro de surfista que encolheu quando estava prestes a dropar uma onda de 2 pés. -
Aí sim, temos a trapaça onde um meio surfista transforma-se num inteiro, ainda maior do que outros, com menos sorte de não terem um amigo com automóvel ou sem grana para comprar o seu próprio.
Imagem é tudo, diz a propaganda. O desafio hoje atende pelo nome de divulgação.
Entenda: Valente me confidencia que num mesmo dia em Portugal, Saca e Grego tinham uma ‘entourage’ com nem sei quantos fotógrafos e cinegrafistas numa investida para surfar Nazaré enorme, enquanto Zé, aquele da canção ‘Seabra is mad’ do Ithaka, acompanhado do Eric Ribiere se aventuravam pelo ‘Spot X’, sem que uma única alma soubesse do feito – aqui entra o acaso e Valente, em cima da hora para registrar e publicar.
Saibam, no entanto, que Saca e Grego são dois dos maiores surfistas da Terrinha e estariam disponíveis para qualquer empreitada, com ou sem platéia, como o fazem na maioria das vezes, sem viv’alma por testemunho.
Mas somem a isso uma pequena fortuna para comprar os cavalos marinhos mecânicos, mais o dinheiro do combustível, cifrões voando com a fumaça e temos motivos suficientes para convocar uma coletiva de imprensa, como fez (e faz!) o Laird desde a primeira vez que montou na motoquinha, isso, porem, não os faz menos ou mais surfistas do que todo resto.
Aqui não tratamos de essência, alma, purismos e essas cretinices, falo de talento, jeito pra coisa.
Rebocados pelo fenômeno do tow-in, vieram surfistas emergentes, aberrações que nunca foram capazes de discernir o momento certo de postar na posição ereta em cima duma prancha, fosse a onda grande ou pequena.
Não por acaso, os pioneiros em ondas gigantes como acompanhamos nas revistas (nós sempre acompanhamos isso pelas revistas, não é verdade ?) eram quase todos windsurfistas – e ele, Laird.
Alguem ainda lembra daquele tubo impressionante do Peter Cabrinha em Jaws ?
Pois aquilo foi absolutamente sem querer, quero crer.
Derrick Doerner quando lá chegou, rebocado, foi surfando a coisa como sempre fez e logo apontou para dentro do caroço como se surfasse em Backdoor, era o passo à frente, por favor.
Eis o que gostaria de dizer: um surfista como Shane Dorian, quando consegue tempo para dedicar-se ao surfe rebocado elimina toda concorrência, mas Dorian faria tudo isso no braço se necessário fosse, como Saca e Grego.
E fariam porque podem.
Quem não pode, vai no reboque.




- A onda que representa pra nova (e velha!) geração a mesma atitude absurda e irresponsável que o monstro do Laird no Tahiti representou a poucos anos atrás - o tow in ficou ultrapassado ? -
PS – Um australiano de 19, desses que competem no circuito de esperanças, Laurie Towner (towner ?), ganhou um campeonato junior em ondas de 3 pés, um mês antes protagonizou a onda da temporada no Backdoor, estampada em página dupla na Surfer e ASL e duas semanas depois dropou uma onda que deixou a comunidade de cabelo em pé no reef de Shipstern’s Bluff, uma aberração da natureza de dar pesadelos.
Nesse mesmo dia, Towner foi rebocado em outras meia-dúzia de ondas mas nada tão arrepiante quanto sua atitude na remada.
Nesse exato momento, a comissão que premia as maiores ondas da temporada se pergunta o que é, afinal, atitude.