segunda-feira, novembro 07, 2005

TV Pirata

Versão: Pipocam fogos de artifício, ecoam os gritos de gol, corro para janela e berro com todas exclamações que cabem numa frase.
Os olhos não desgrudam um segundo sequer da tela da TV, o futuro do time que torço está em jogo.
25 minutos do segundo tempo, empate é péssimo resultado, locutor e comentarista chamam, em pleno ataque arrasador da minha equipe, uma celebridade no estúdio, corta para celebridade constrangida, 'Ué, voces não deveriam estar mostrando o gol?'.

Fato: Slater tem a bateria mais esperada do WCT, centenas de pessoas de acotovelam de pé na beira d'água em Imbituba, assinantes do canal pago SporTV tem toda sorte de acompanhar ao vivo o evento sem sujar os pés de areia.
A expectativa é tão grande que o ar fica pesado, tenso, os apresentadores tentam disfarçar.
Slater surfa duas ondas fracas e dá impressão de ansiedade – evitou o surfe para esquentar de manhã cedo – parece querer colocar a prancha no pé e sentir melhor a onda gorda e fraca da Praia da Vila.
Diana, sempre animada, nos avisa que o Skatista homônimo da nova estrela do surfe, Mineirinho, acompanha, ao vivo, a bateria.
O que acha o skatista de tudo isso ?
Corta para Mineirinho constrangido em estúdio no Rio de janeiro, ‘Ué, voces não deveriam estar mostrando o aéreo imbecil que o Cramulhão mandou agora na última onda ?’.
Morou ou boiou ?

Acabou a paciência com a transmissão ao vivo.
Pulo para internet, em inglês, estão os dois concentrados na bateria, afinal o motivo deles estarem ali é exatamente esse.

Os ossos do barão

Por alguma razão que ninguem consegue explicar, resolveram que o surfe é apenas interessante decorado por periféricos.
Não é novo não. Aconteceu nos 70, repetiu-se nos 80 com grande esperança e renasceu nos 90 com os tempos modernos.
Cíclico, como o humor dos Deuses dos Mares.
Transmissão de campeonato de surfe precisa de ‘elementos’, como gostam de dizer nos veículos de comunicação, coisinhas tipo mulheres bonitas fazendo perguntas idiotas e repetindo informações como atendentes de tele-marketing, repórteres eficazes e aplicados na fórmula Armando Nogueira de romantizar e esmerdalhar qualquer assunto banal, palhaço, malabarista, domador e equilibrista.
A ordem de cima deve vir mais ou menos assim: ‘Tudo, menos surfista’.
Quando exibem 12 horas seguidas de tênis é locutor sério e comentarista analisando o que acontece na quadra.
A mesmíssima coisa com Basquete, Ginástica Olímpica, Futebol de salão, de praia, ou Vôlei.
Uma transmissão dessas, com exclusividade, tanta gente envolvida, um esforço enorme e grana preta é destinada, ouso acreditar, para entusiastas do esporte.
No surfe é para todo mundo, menos para o surfista.
Um camarada que se exalta com Bocha, como o taxista que conheci em São Paulo, jurava ser bocha o esporte mais emocionante desse mundo, ‘nada igual ao bocha’, repetia com rosto vermelho.
Voce pratica esporte ?
Respondi que fazia surfe de vez em quando e o olhar que o coroa lançou pelo retrovisor foi pra lá de descrições, perdido entre decepção e pena.
‘Tsc, tsc… coisa mais sem graça…’
O que tento dizer é que esse ser cegamente fiel que é o surfista gosta de ser tratado com respeito, principalmente quando falamos de ASP, Slater e Irons.
Já não basta o gigantesco equívoco do Pauno Lima fingindo que apresenta o programa do WCT e nós fingindo que acreditamos ?
Falta urgentemente uma direção na transmissão do WCT, uma liderança que oriente camêras a focalizarem os surfistas nas poucas vezes que eles trepam nas pranchas.
Numa bateria de 30 minutos os competidores não ficam mais de dois ou tres minutos de pé na tábua, como dizia meu Pai.
É pouco, muito pouco e requer toda atenção da equipe de cinegrafistas.
Tempo, há de sobra, quando eles remam de volta, para os comentários dos apresentadores se pertinentes ao campeonato.
Imperdoável que se deixe de exibir uma única onda na transmissão – seria equivalente a perder o duplo twist carpado da Daiane ou um gol do Pet aos 47 do segundo tempo.
Reconheço que é muito melhor ter do que não ter um mimo destes, mas seria muito melhor se feito por quem entende do riscado, como Bocão, por exemplo.


Essa é pra tocar no rádio

Segunda feira, dia 7 de Novembro, a carruagem do Heitor Alves virou abóbora. Diante do surfe limpo e eficaz do tri-campeão Andy, o cearense parecia uma galinha d’Angola de tanto que ciscava.
Cisca pra cá e cisca pra lá, tome bomba de Irons, firme, potente, ainda que meio desajeitado com aquela onda chôcha, toda torcida contra.
O julgamento desse campeonato remonta de duas décadas atrás quando os locais ganhavam pontos extras para fazer média com o público.
Na transmissão, repetia-se uma mentira várias vezes, como Goebbels, até virar verdade.
Luciano do Vale fazia isso com Maguila, empurrando goela abaixo o gigante do queixo de vidro até ele ser finalmente trucidado por Holyfield e um lento e pesado Foreman.
Perdoem-me se não consigo digerir o surfe dos novos salvadores do surfe nacional e acredito apenas no talento do Trekinho, Pedrinho, Raoni, Mineirinho, Pigmeu e Léo.
Hei de ver dois comentaristas discutindo em alto nível sobre estilo, força, posicionamento, equipamento e estratégias de competição sem recorrer ao ponto eletrônico.
Espero ver, talvez nos próximos 200 anos, alguem isento que nem queira fazer média com público ‘jovem’, defendendo exaustivamente a nova geração como se esta precisasse de defesa, nem malandro advogando em causa própria na esperança de eternizar-se virtualmente.
O surfe tem mais uma chance histórica de alcançar o status de esporte com direito à transmissão ao vivo e tem provado na internet que o caminho é duro, mas prazeroso.
John Shmooka, ele mesmo um excelente surfista e ex-competidor, arrebenta como mestre de cerimônias nos eventos da Quiksilver, que convida seu ilustre time de membros que vai desde Tom Carrol até Martin Potter, dois campeões mundias sem papas na língua.
Os programetes Live at 5 são belas pílulas ao final de cada dia de competição e funcionaria muito bem no SporTV se houvesse gente capaz de produzir coisa semelhante – e há, afirmo sem medo, Bruno Bocayuva é prova disso, tem num dedo mais cultura de surfe (e geral…) do que toda equipe em Floripa.


Simpatia pelo Diabo

O Fascinante de ouvir os papos do Mark Richards com Cheyne Horan está no detalhe.
O magrelo corcunda foi questionado sobre os ‘novos critérios da ASP’ e saiu com essa:
‘Isso é balela! O que dá nota e sempre vai dar nota é surfe bom, puro e simples. Aéreo, rasgada, um velho e bom cut-back ou uma porrada, não importa, voce sabe quando o cara tá surfando de verdade.’

Eu vi a luz

Ainda no aborrecido assunto da cobertura da imprensa no Dabúcetê.
No Jornal Globo, o enviado ‘quase’ falou sobre uma possível politicagem no evento, mas como é convidado da produção não pode dizer um ‘ai’ dos anfitriões.
Toda imprensa vai à convite do evento e é cortês de retribuir a gentileza com elogios.
Enquanto isso, nem uma única palavra sobre a escolha de uma das piores ondas do litoral como palco de tão importante evento.
Santa Catarina tem um dos mais bem dotados (êpa!) recortes de litoral do Salvelindo, das espetaculares esquerdas da Guarda até os tubos do Moçamba, mas curiosamente as únicas ondas que são levadas em consideração são Praia Mole, Joaca e Vila.
Qual sentido em ter as maravilhas da mobilidade ?
Alguem ouviu o tilintar de moedas ?

5 comentários:

  1. Anônimo4:33 PM

    é, tb não acreditei quando botaram o sandro dias e perderam a onda incrível do slater, palhaçada e falta de profissionalismo foi pouco. outro detalhe: teco é um grande sujeito, fez história, mas não pode ser o único surfista comentando o wct. sim, ele entende, mas alivia. faltam análises mais críticas. aliás, falta qualquer crítica. talvez o fabinho gouveia, ou o picuruta dessem conta do recado. o velho gato desbocado não vai ficar alisando cara que não arrebenta. e de estilo ele sempre entendeu. abraço, zé augusto
    ps- e não dá pra aguentar o comentário tão pobre de que o slater é um campeão "casca-grossa". será que nem "mito vivo" poderiam ter falado?

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  2. Anônimo7:58 PM

    Júlio,

    como repórter, trabalho com fatos, embora ache que o jornalismo, para ser mais profundo poderia ser também opiniativo (o bom é que acho que isso é uma tendência). Por enquanto, opinar é uma exclusividade de colunistas, não caberia a mim, embora isso não me impeça de dar tom crítico aos meus textos. Nào é porque fui convidado do evento que deixei de fazer uma crítica que considerei pertinente, quando disse que, nos bastidores do WCT em Florianópolis, o comentário geral era de que as brigas entre associações de surfe locais e acordos políticos feitos pela organização (não sei se do Xandi Fontes, diretor de provas e vereador local, ou do Teco, ou dos dois) estavam atrasando o proseguimento da competição, que poderia ser levada para o Campeche, Praia Mole, Brava e por aí vai. Como ninguém foi capaz ou teve coragem de me dizer isso em "on", isto é, bancar a crítica com o nome publicado no jornal, não poderia fazer uma série de afirmações sem o embasamento necessário. O que fiz, e acho que foi pra o bem do surfe, foi dizer aos organizadores que, se eles esperam que o esporte se popularize, tenha o destaque nos veículos de comunicação de massa que acham (e acho mais ainda) que devem ter, eles precisam melhorar e muito a organização dos eventos. Passamos cinco dias de cancelamento sem que nenhum membro da ASP ou da organização aparecesse para dar satisfações, ou trazer um surfista ranqueado para falar ao menos 15 minutos. Imprensa diária vive de fatos. Sem isso, como iríamos vender matéria, brigar por espaço para o surfe nos jornais? A mídia impressa (não revistas especializadas, todas devidamente credenciadas e bajuladas) ficou totalmente vendida, sem a tal pulseirinha que nos daria condição de fazer uma boa cobertura do evento. Elas foram distribuídas para uma porção de convidados que em nada ajudaram aos profissionais que estavam lá, só atrapalharam. E vc ou qualquer leitor do Globo, da Folha de São Paulo, do Lance e do Estadão só puderam ler algumas declarações do campeão do mundo no dia seguinte à conquista porque a organização foi intimada a levá-lo à sala de imprensa. Enquanto isso não aconteceu, ficávamos todos sem ter como trabalhar, com nossos editores dizendo ao telefone, sentados em suas cadeiras nas redações, que o surfe seria capa do jornal, com dois altos de página e por aí vai. E, nessa hora, vc deve saber, não tem essa de dizer que não dá pra fazer, vc tem que fazer.
    O surfe, ao que me parece, precisa abrir suas portas para os grandes veículos. Por enquanto, o que parece é que a transmissão da inglesa TWI e os caciques da ASP se bastam.
    Espero ter contribuído. abs

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  3. Fabio,
    imagino que sua tarefa em cobrir o Dabucetê de Floripa não deve ter sido fácil.
    Percebi isso no primeiro texto publicado.
    Entenda, por favor, que não se trata de ataque pessoal, nem perseguição com jornalistas da grande imprensa (tambem acho uma piada essa conversa de 'grande' e tal, mas é um jeito de identificar jornal como O Globo), ainda pelo contrário, ataco sim, o método de rodízio.
    Explico: O Globo, nossa referência aqui, traz de tempos em tempos coberturas de campeonatos de surfe e curiosidades periféricas dessa cultura de praia. Cada vez que o olhar aponta nessa direção indicam um profissional diferente para 'cobrir' a notícia.
    A roda viva duma redação não deixa muito espaço para se cativar, melhor seria treinar, um dos profissionais em determinado assunto.
    Naturalmente, se esse profissional não tem chance de trabalhar com esporte, cultura ou homicídio, fica complicado pr'ele decidir que rumo tomar.
    Túlio Brandão, nesse caso, começou fazendo eventuais coberturas esportivas e partiu para o jornalismo ecológico - onde vem fazendo excelente trabalho - mas era um dos poucos que poderia fazer cobertura decente do surfe fosse livre suficiente para isso.
    Voce tem razão quando diz que lida com fatos.
    Do meu lado, de observador, creio firmemente que o papel do jornalista é acima de tudo a sinceridade com leitor e essa franqueza deve sempre fiscalizar o poder, sem se importar com as diferentes formas que ele se manifesta.
    Se a ASP e organização do evento não tem, ou teve, competência para atender a grande imprensa é dever do jornalista cavar fundo esteja a notícia onde estiver (e aqui não ache que se trata de conversa pra boi dormir).
    Dois ou tres telefonemas resolvem.
    A imprensa especializada acomodou-se com o novo-jornalismo feito a base de press releases, mastigadinhos pela ASP, ninguem foge do feijão com arroz.
    E, se quer saber, boa parte dos ditos especialistas conhecem surfe tão intimamente quanto física quântica.
    Mas voce buscou fontes seguras: Steve Sherman é amigo do Rei - de verdade!
    Sabendo-se perdido no meio de convivas do viciado ambiente Vip que infesta os grandes eventos, nos resta buscar outras fontes de informações.
    Percebo que a cartilha que O Globo prega dentro da editoria de esportes não é das melhores, vide o Ibrahim Sued esportivo, Renato Maurício Prado, que trata bem mais de fofocas do que de notícias, tem mais de dois terços de suas colunas escritas via imeios de leitores com estórias e causos reprisados dos livros do Sandro Moreyra e João Saldanha (que, cá entre nós, duvido muito que venha mesmo dos leitores) e volta e meia arrisca palpites mais infelizes do que da música do Noel - o mais célebre, afirmando que Guga, nosso Guga do tênis, tinha que trocar de técnico senão não iria a lugar algum, foi.
    Tenho profundo respeito pelo Calazans e Awi.
    Achei um furo a falta de cuidado com a derrota do Vitinho, mesmo admitindo que o hepta é dose pra leão, mas em duas páginas o surfista de Cabo-frio merecia o devido destaque.
    Pelo que parece no seu texto, Fábio, voce é bem intencionado e segundo consta teve educação de primeira no Colégio São Bento.
    O surfe precisa de gente interessada, sem medo, para realizar coberturas sérias e certeiras, sem o velho papo de gente bonita e saudável, sol, biquinis e festas.
    Voce acompanhou de perto e viu que há frustrações, dias nublados e frios, desonestidade, preconceito e euforia, da mesma maneira de todos outros esportes.
    Atraímos muitos aproveitadores seduzidos pelo tão falado 'estilo de vida' que só existe nos anúncios de roupa de surfe e planos de saúde.
    Nosso esporte não é tão raso.
    A cobertura da TWI, se voce quiser saber, é exatamente igual a da Dynacom dos anos 90 e bem pior do que a feita nos 80.
    Uma troca de mensagens como essa que voce fez, contribuí e muito para melhor diálogo.
    Fico lisonjeado de ver um jornalista como voce perdendo precioso tempo para responder uma crônica que pensava lida por meia dúzia de gatos pingados.
    Abaixo a pulseirinha!
    Abrazzo
    Julio

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  4. Anônimo8:27 PM

    "aí maluco", "tamo junto", "lado-a-lado" e outras neo gírias que tentam lançar moda, definitivamente surfe pra essas pessoas é algo muito passageiro, muito novo e jovem, passou dos 25 anos começa a perder a notoriedade mas o bom, é que volta e meia resurge um Currem para dar alguma aulas extras pros moderninhos....Um dia, eu acredito, um dia ainda iremos assistir uma transmissão de qualidade, uma transmissão feita pra surfistas....

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  5. Anônimo8:10 PM

    Caro Adler, bastante oportuno esse post sobre o wct. Sinto-me no direito de fazer uma crítica, (afinal pago caro pra caralho pela assinatura da SKY)e dando nome aos bois, eu gostaria muito de saber de onde saiu o tal do Tiago Brant e pseudo gangsta Diana Bouth. O Brant pode até pegar onda (tem escolinha de surf espalhada por aí a cada verão)mas não sabe nada de surf, assim como a Bouth, que ficaria muito melhor apresentando clips de rap duvidosos na emetevê.
    Em alguns momentos até mesmo o Teco padaratz ficava meio perdido e acabava sucumbindo a boçalidade reinante.
    Seria bem interessante colocar o Bocão junto com o Cauli, ou o D´Orey como comentaristas.

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