Valter e sua arte - Foto Agobar Jr |
Valter é um sujeito comum, feito eu e voce, exceto pelo talento absurdo que Deus lhe deu para pegar onda.
Quando sobe na prancha, Valter deixa de ser uma cara normal e vira uma especie de divindade pro resto da multidão que lota a praia.
O pessoal tem uma baita admiração pelo Valter.
Mas ele pouco se importa com isso, Valter gosta é de pegar onda - e o que ele gosta ainda mais é de onda ruim.
Sim, voce leu certinho, onda ruim.
Fechada, mexida, sem força, buracão, pequena, grande, estilhaçada, torta, feia, porcaria de onda.
Por ter tanto talento pra surfar, Valter age como mais ou menos como Brando fazia na escola.
Explico, Marlon Brando sabia que era o menino mais bonito do colégio, mais carismático, as gatonas se derretiam por ele e Brando as ignorava por puro despeito.
Brando, sempre um provocador, escolhia as rejeitadas simplesmente pra chocar.
Valter, por outro lado, não quer chocar ninguem, quer apenas se divertir.
Nos dias clássicos, a turma senta na areia e assiste Valter desenhar as curvas mais lindas nas ondas que sobram - raramente ele dropa a maior do dia ou mesmo disputa onda no pico.
O maior talento do Valter é transformar lixo em arte, assim como um Arman (Google nele!), ou, pra usar um exemplo mais atual e brasileiro, Vik Muniz.
Onda perfeita, reflete Valter, qualquer um surfa.
Quero ver encaixar numa craca a 100 por hora e acertar a junção, sem voar braço pra tudo quanto é lado.
A cena descrita acima não dura mais que 10 segundos, parem pra pensar nisso.
Valter acha muita graça nos amigos que desprezam onda ruim - e não são poucos os que debocham dele.
É que Valter não curte gastar a grana suada em longas viagens, existem outras prioridades, família antes dessas extravagâncias e estamos conversados.
Volta um amigo da Indonésia, passa horas contando das ondas formidáveis que surfou, o luxo do barco, a cerveja gelada, os bons companheiros que teve a sorte de conhecer e Valter acha um barato tudo aquilo, sinceramente.
Não pensei voces que Valter nunca viajou!
Ele viajou sim, quando ainda era solteiro, não tinha filhos, e ele viajou um bocado.
Até hoje os locais se recordam das ondas do Valter naqueles picos isolados do Oeste da Austrália, ou no Kauai, mesmo nas Filipinas tem gente que não esquece o jeito elegante do brasileiro cabeludo.
Acontecia, quase sempre, do Valter voltar pra casa e logo na primeira semana, alguma coisa mágica acontecia, como por exemplo, voltando da Indonesia pegar um Ipanema de leste, daqueles que a onda corre paralela a praia e ninguem consegue passar pelas sessões super rápidas.
Nesses dias impossíveis, Valter ia lá e pegava a onda do dia.
A turma se reunia final de tarde e cada uma das testemunhas daquele momento sublime descrevia a onda, igual a Desert Point.
Que ninguem se engane achando que Ipanema - ou qualquer outro pico aqui no SalveLindo- quebra, ou quebrou, alguma vez como Desert Point, mas com Valter Ipanema virava Pipe, J. Bay, Puerto - era o dom do cara.
Sua maior alegria era comparar os melhores, e piores, dias na sua praia com as ondas mais cobiçadas do planeta.
Nelson Rodrigues, cronista que criou o estilo mais copiado da nossa imprensa (que o diga Jabor, todos dias, mil vezes!) dizia que não podia nem atravessar o túnel que já sentia um estrangeiro.
Valter tinha essa mesma estranha sensação.
Era capaz de surfar um dia clássico em Padang incomodado ao saber que o Leme quebrou olímpico.
Sentia um baita desconforto quando estava longe das suas tão amadas praias.
Não conseguia entender porque buscar tanto uma coisa que estava ali tão perto.
O que Valter procurava, desde moleque, cavucando buraco na areia pra pegar tatuí, soltando pipa nos dias de sudoeste, jogando pelada na praia, ou pegando onda, não era a perfeição.
Valter buscava simplesmente a diversão e nada o divertia mais que um dia de onda ruim.
Ele era feliz assim.
E fazia a alegria de quem o cercava.
Valter é um sujeito comum, feito eu e voce, exceto pelo fato que ele ama onda ruim.
Valter é o cara :) Sou fã, pega muito!
ResponderExcluirsimplesmente não sobrou mta coisa da onda por onde a prancha de Valter passou por cima.
ResponderExcluirmuito bom!
ResponderExcluirQualé Julio! Sou fã do Valter! O cara surfa muito! Surfa fácil... surfa bonito! Ele é ídolod de um legião de BRASILEIROS (principalmente os cariocas), além de um mestre na arte de shapear. Já tive o prazer de surfar com ele algumas vezes, mas não sabia que ele não se importava com as ondas ruins... na real ele prefere onda boa, mas sabe surfar qualquer onda. O cara é um Mestre! Occy power Style! Aquele video dele em Asu é um esculacho! Abs
ResponderExcluirTambém amo onda ruim! Jóia o texto.
ResponderExcluirNo meu início no surf, quando ia surfar no posto 5, quando o fundo proporcionava umas valinhas muito ruins, nos dias que o Valter e um irmão do Guilherme Tamega estavam na água, eu passava mais tempo na areia admirando o estilo de surfar deles do q no mar surfando.
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