quarta-feira, novembro 30, 2005

Curren

[texto da revista Surf Portugal, Outubro 2005, Nº153]

Curren

Se alguem ousasse dizer, no arder dos findos anos 90, que o um surfista de 41 anos de idade seria o destaque da etapa do WCT em Trestles, onde o surfe respira cifrões como num quadrinho do Tio Patinhas, arriscaria a ouvir uma sonora gargalhada acompanhada dos maiores desaforos e deboche para mais de mês.
Tom Curren passou pela triagem de 16 estrelas, que incluía Bob Machado, levou cano na primeira fase e bomba na repescagem, mesmo assim só se falava dele de Imperial Beach até Steamer Lane.
Curvou-se Andy Irons, derramando elogios ao tambem Tri-campeão mundial depois da bateria que competiram juntos na primeira fase: ‘O cara é uma inspiração! Olhando sério pra mim e encarando como fazia nos anos 80… e as suas famosas rasgadas, na minha frente, jogando água no meu rosto…o cara é sensacional…ainda ebm que tive uma ajuda dos juízes’ – faltou agradecer ao TC por ter espirrado água santa e pedir autógrafo.
Exageros à parte, a inversão do culto ao teen é mais uma obra do Santo Curren, coisa que Occy, mesmo com sua fantástica recuperação e título mundial combinados com vídeo biografia, não conseguiu.
O mais impressionante dessa história é que nem foi preciso um resultado fabuloso, fogos de artifício, modelos bizarros de prancha, tragédias pessoais, revoluções no sistema de julgamento, nada disso.
Curren apenas continuou na dele, fazendo o que sempre fez, competindo aqui e ali, tentando verdadeiramente se reclassificar, ou classificar desde que nunca fez parte do WCT, embora sem sucesso, mas sem sair atirando no sistema da ASP, como Gerlach, Beschen e Machado. O homem quieto de Santa Barbara acredita no que faz e sabe que tudo é questão de tempo – e ele é dono do seu.


Curren voltou às capas de todas revistas como nada tivesse acontecido

Tempo que é generoso com ele, fixando bem que trata-se de 41 anos, um senhor com dois casamentos e 3 filhos, tempo que passa por baixo de sua prancha em cada onda que surfa com seu posicionamento mágico – o surfista mais copiado de todos tempos(olha ele aí de novo!) e jamais imitado.
Slater foi um dos que bebeu na fonte, dividindo ainda no princípio da carreira os mesmos patrocinadores, OP e Al Merrick, com o maior ídolo da América- o surfista que encerrou de vez o domínio australiano em 10 anos de circuito mundial, com excessão do título em 77 do Sul-africano Shaun Thomsom - logo em seguida ao mundial amador do Japão em 90, Slater foi mandado para uma ‘clínica’ com Curren na França, para ‘polir’ seu estilo com o ‘mestre’.
Em 85 ele era apontado como imbatível, sobrenatural, exemplo a ser seguido dentro e for a d’água, todo aspirante a competidor rodava o braço e virava a cabeça quando batia na junção, em 95 suas viagens na campanha criada por Derek Hynd para Rip Curl, The Search, mudaram o comportamento da nova geração, impondo silenciosamente uma democracia de equipamento, com fishes e afins em qualquer condição de surfe que originou uma onda retrô que enche os bolsos da indústria a uma década.
Chega 2005 e o brilho não diminui.


Foto gentilmente afanada do saite do fotógrafo Sean Davey


A própria Rip Curl o recontrata e lança produtos com seu nome, aparece nas capas das principais revistas de surfe do planeta e é apontado como destaque da temporada Havaiana, segue o WQS atrás de pontos e atrái cada vez mais devotos, como no episódio em Maldivas, onde dividiu um barco com a nata da nova geração de brasileiros durante uma semana e deixou Jihad, Trekinho, Bruninho, Junior , Pedrinho e o diretor Rafael Mellin boquiabertos em sessão exclusiva.
Os garotos sequer quiseram surfar, preferindo admirar a linha do pontífice do estilo, aplaudindo cada onda como apreciadores de música barroca ao assistir um concerto.
O carisma desse sujeito é uma coisa irrestível.
Passa geração, entra geração e Curren permanece como mito, vide a reverência quase religiosa que se faz à ele em Trestles, ou na etapa de Reunião, quando os top 45 se acotovelam para assistir as exibições de classe ímpar.
A indústria, tão voltada para a juventude consumidora maciça, esquece por alguns momentos dos seus vícios e tambem se curva, deixa de lado Andy, Bruce e Kelly, volta os holofotes para o semi-Deus e avisa que por trás daquele circo, dos milhões de Dólares, das mega-lojas, das ações em Wall Street, por trás disso tudo, temos história.
Curren resiste ao tempo, o tempo por sua vez não resiste à Curren.
O maior enigma que o surfe ousou ter.

7 comentários:

  1. Anônimo11:00 AM

    "como no episódio em Maldivas, onde dividiu um barco com a nata da nova geração de brasileiros durante uma semana e deixou Jihad, Trekinho, Bruninho, Junior , Pedrinho e o diretor Rafael Mellin boquiabertos em sessão exclusiva."

    Só faltou o Super Herói: Zé Empáfia (vulgo Mineirinho), para assistir ao mestre. Se bem que ele declara piada o Mestre ser convidado para WCT. Portanto, perde e continuará perdendo a oportunidade de melhorar sua base SAPO.

    Isso tudo endossado pelos megalomaníacos daquela revista ( a Mad do Surf): Grandão Bobão e Alex Antarctica (se bem que está mais para Tubaína). Os mesmos não são capazes de chegar perto de um editorial do calibre do Julio Adler. Deixo apenas o Boca, fora do peleguismo que impera em tal publicação.

    E aproveitando, o sítio paulistano (essa palavra me da náuseas): www.ondas.com.br (WAVES), deveria parar de publicar matérias enaltecendo free surfers totalmente desconhecidos como do tipo: Fulano arrepia no Hawaii. Cara tá cheio de Pró lá realmente arrebentando que precisa do espaço na mídia e os paneleiros (sinônimo de paulistano) lançam os amiguinhos. Também o que se esperar de veículo que abre mão do nosso melhor colunista. Para tudo, colunista não! Melhor e único crítico independente do Surf Brasileiro: Sr. Julio Adler. Por alguns míseros tostões solicitados de aumento.

    Julio,

    Uma pergunta que não quer calar: Porque será que os maiores destaques no Hawaii vem Do Rio de Janeiro ?????

    Peço seu auxílio para desvendar esse dilema tostines.

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  2. Deixando bairrismos de lado - que não é do que o texto trata - mais uma vez parabéns. Acertou na mosca. Já senti algo parecido quando Mr. MR era o homem. Mas Curren realmente marcou fundo. E apesar do careca aparecer bem mais - ele adora a mídia (e vice-versa) - Curren consegue o seu espaço sem fazer o menor esforço.
    Definitivamente merece estátuas por onde passa.

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  3. Anônimo2:43 PM

    Que blz de texto!

    Pena que só sai numa revista lá do outro lado do oceano...

    Abs,

    Brunin.

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  4. Anônimo9:12 AM

    as ondas mais fortes e tubulares da costa brasileira, estão bem aqui no rj e, nem adianta algum engraçadinho vir falar que fernando de noronha que é o bicho....aquilo lá é lenadfa apesar de tr uma beleza natural exuberante, as ondas são reLMENTE BURACO MAS FECHAM SEMPRE E SÓ HÁ PRATICAMENTE 2 ONDAS COM CARACTERÍSTICAS DE TUBO O RESTO É MITO E MITO POR MITO, AQUI NO RJ AINDA TEM MUITO MAIS "MITOS" QUE NORONHA E O RESTO DO PAÍS INTEIRO JUNTOS DAÍ, OS MELHORES OU OS QUE SE DESTACAM MAIS, SEREM CARIOCAS OU OS QUE DE OUTRO ESTADO, ACABAM POR FIXAR RESIDENCIA POR AQUI...

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  5. Anônimo11:54 AM

    gostaria de acreditar que o Curren voltou as revistas só pelo sua magistral categoria ! Pena .... pensar que ele ficou longe esse tempo todo só por falta de um patrocinio forte ... se o mestre do estilo fica afastado da midia por falta de empurrãozinho das marcas donas do surf o que esperar dos nossos brasileirinhos sem patrocinio !

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  6. Anônimo7:16 PM

    Curren passou vários anos meio confuso, fato normal na vida de muitos de nós. Não foi a falta de patrocinadores, como alguém falou. O próprio Curren já falou sobre isso. Por esse período, seu surfe sem dúvida enferrujou. Isso uma causa de dificuldade de conseguir vaga no WCT; a outra o critério de julgamento, que mudou MUITO. Quem acompanha assiduamente sua tentativa de volta nota indícios sutis de estar voltando à uma excelente forma. Se mantiver a pegada, podemos ver algo interessante em 2006. Não que precise. Acho que voltou a surfar e competir por prazer, o que é inspirador. Como seu surfe, mesmo que não consiga se reclassificar. Vamos ver o que os deuses do surf têm a nos oferecer ...

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  7. Anônimo6:18 PM

    Curren, mestre simplificador das complexidades do surf (mas nem tanto da vida), sem esforço, sem "forçação" de barra... Certíssimo. Mas o que é Occy e sua selvageria classuda em J-Bay? Desculpem o desabafo, não muito próprio neste tópico, mas o cara está dando linha e desde já deixando saudades... É a adolescência do surf, a pureza, a descoberta... Muitos foram os finais de tarde inspirados pelo Tosco na Terra mas Ogro no Mar, no Postinho, Pepino, CCB... Occy é reticências!!

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