[Sopa de Tamanco#04 - Revista Hardcore 07/2009]
“Mas, olha, o que eu digo sempre, é muito fácil fazer uma Austrália: pega meia dúzia de franceses, ingleses, irlandeses e italianos, joga numa ilha deserta, eles matam os índios e fazem uma Inglaterra de segunda, porra, ou de terceira, aquela merda.
O Brasil precisa aprender que aquilo é uma merda. Que o Canadá é uma merda, porque repete a Europa. É para ver que nós temos a aventura de fazer o gênero novo. A mestiçagem na carne e no espírito. Mestiço é que é bom.”
(Darcy Ribeiro em "Mestiço é que é bom", Ed. Revan, RJ, 1997)
Professor Darcy, como gostavam de o chamar, apostava na mistura como grande virtude do povo que ele tanto se orgulhava.
Darcy sabia das coisas.
Sem frescuras ufanistas, esse patriotismo cego que as vezes querem nos aplicar sem eira nem beira, essa percepção de país do Darcy abriu os olhos de muita gente - olhemos pra dentro, não pra fora pessoal.
No ranking final do primeiro circuito mundial de surfe profissional ja estávamos la, muito bem representados, pelo loirinho cheio de talentos, Pepe Lopes em 18º, na frente de gente da categoria do Rabbit, Lopez (com Z), Reno Abellira e Paul Nielsen.
Pepe poderia passar por australiano ou americano facil, facil, pegando um tubo em pe em Pipe ou de esperando o metro em Paris.
Logo ali embaixo no ranking, ainda nos top 30, em 24º, um judeu mulato com cabelo black power, mestre do estilo duas decadas antes do Fabinho- senhoras e senhores, Daniel Friedman.
La se vão 33 longos anos.
Entre 1976 e 2009 todo tipo de brasileiro passou pelo circuito, de cima a baixo, ou seja, primeiro na batalha pelos top 30 como Pepe, Daniel (28º em 77!), Cauli, Otavio, Rico, Boca e outros aventureiros que corriam atras não dos pontos ou da grana mixuruca, nada disso. A rapaziada tava ali pra se divertir e esticar a juventude até não poder mais (embora não soubessem ainda).
Chega os abominaveis 80, decada da redenção do surfista esforçado, e o Bananão emplaca uma nova e promissora geração que começara a prometer no finzinho dos 70.
Eram eles, Valdir (23º em 81, po!) Fred, Picuruta, Valerio que chegavam capitaneados pelo glorioso Cauli (Daniel ainda resistiu até 83/84) num ataque modesto e ao mesmo tempo furioso no circuito mundial.
Em 1988 entra Teco e Fabinho, um loirinho-loirinho, descendente direto da colonização alemã em algumas selecionadas cidades do estado de Santa Catarina e um cabra da peste, la do outro lado do nosso país continental, tambem com sangue europeu na sua ascendência mas com caracteristicas muito mais associadas a imagem mitologica do brasileiro, digamos, comum.
Pois foi o brasilleiro comum que derrubou todos preceitos e preconceitos para tornar-se, bem, voces sabem...
Um leitor mais atento e afoito gesticula indignado pela absoluta falta de criterio para omitir tantos nomes de peso dessa introdução.
Sim, claro, estou omitindo valorosos guerreiros, Muller, Phebo, Rodolfo, Burle, Eraldo, Boscoli, Tendas, Piu e cia, mas o assunto é outro, como voces verão logo adiante.
Nos 90, o mundo passou a confundir-se com a quantidade e a variedade de rostos brasileiros no meio dos 44.
Tinga, Jocelio, Tadeu, Joca, Peter, Renatinho, Costa, Mandril, Silva-sauro, Papito, Vitin, Herdy, Neco, Renan, Mandinho, completamente diferentes em todos aspectos, dentro e fora d'água.
Indio, crioulo, russo, moreno, loiro, alto, baixo, cabelo bom, sarará, elegante e mulambo, nossa nação tava todinha la, dum jeito ou de outro.
Na Zona sul do Rio de janeiro e nos bairros nobres das principais capitais do Bananão (assim Fausto Wolff apelidou o Florão da America) a turma bem nascida não se enxerga no mestiço.
Não se enxerga e sequer admite pertencer a mesma etnia, e ai de quem ousar dizer que sua pele branquinha e cheirosa faz parte do que conhecemos como povo brasileiro.
Eu não! Revolta-se o rapaz de gola role.
Sujeito não quer se reconhecer naquela figura porque representa o que ele entende como andar de baixo da piramide social e ele, o sujeito, ta la no topo, ou acha que ta, sei la...
O camarada quer ser representado por um cara que ele se identifique, mais pr'um Jesse do que um Pablo.
Somos um bando de preconceituosos abjetos e indecorosos, exatamente como os gringos que sempre acusamos de discriminação - começa em casa.
Do jeito que a coisa vai, em 2010 é melhor nos acostumarmos com o mestiço batendo firme nos arianos.
Depois de anos investindo em viagens para surfar ondas de verdade como Indonesia, Taiti, Havai e Australia, treinamento com fisioterapeutas, psicologos, nutricionistas, aulas de ingles e o escambau, é a vez da geração 010.
Não estou falando do futuro, to falando do presente.
Temos hoje uma lista de surfistas pra todos gostos, free-surfers como Junior Faria que correm atras apenas de polir seu estilo e o jeito de ler a onda. Jeronimo Vargas é herdeiro direto e literal do maior tube rider que o Brasil ja teve, Valdir Vargas, e com apenas 20 anos e um surfe pra la de maduro ainda vai, se assim desejar, aprender a domar baterias no WQS.
Jesse Mendes é o caçula da turma, junto com Ian Gouveia, ambos ja com invejavel intimidade com tubos, extrema facilidade com aereos e surfe com poucos vicios (graças aos treinadores, paulo Kid e, bem, Fabio Gouveia...).
Alejo é um monstrinho desde novo, tem sangue argentino correndo nas veias, estilo de sobra, concentrado, serio, focado. Ja tem uma vitoria no WQS em 2009, 6 estrelas em Portugal, dificilmente não estara no World Tour de 010.
Miguel Pupo, todos sabem, filho do Vala, competidor ferrenho, duro na queda, passou pro filho a paixão por baterias. Miguel apimentou com um repertorio de manobras que o pai nunca sonhou.
Gui gui Dantas, duas vitórias gigantescas no WQS em 2008, pagina dupla na Surfing (com nome certinho, coisa rara)nenhum surfista com menos de 20 anos faz isso impunemente.
Pablo, como diria o Bocão, uma bomba relógio, prestes a explodir se conseguir manter a cabeça atarrachada no pescoço.
Jadson ja nem sei mais o que dizer, uma maquina de finalizar onda com aereo reverse, ganhador de bateria da molestia, aluno aplicado e dedicado. Ja esta entre os 45 pra 2010, afirmo sem medo.
Felipe Toledo me assustou la em Noronha.
Kid me diz que tem um tal de Victor Bernardo, que é o Tinga remixado.
Darcy, que não surfava, diz ainda assim: Somos melhores porque lavados em sangue negro, índio, melhorado, tropical.
Tropical, camarada, tropical.
e o gurizão medina?
ResponderExcluirPQP, é da mistura também
valeu
André(Mariscal)
... e se deus quiser, em breve, como diz um amigo meu, vamos nos livrar daquele 3o lugar "caveira de burro" que o Vitinho deixou pra gente la em 99...
ResponderExcluirPorra, animal esse post Julio! Cheguei a ficar com um nó na garganta amigo..."olhemos pra dentro", coisa q a gente ainda esquece(?)."Mestiço é que é bom"...
ResponderExcluirAbraço
Sem falar na citação ao Fausto Wolff, cronista fodaço da palhaçada brasileira e absurdamente desconhecido da maioria...
ResponderExcluirMarreco, o Natanael Jebão das crônicas de surf.
Viva a mestiçagem! Bananão na raba dos arianos!
Medina tem vaga nesse time. Na minha opinião foi a relevação de 2009 no surfe verde-amarelo. Futuro certo se manter o foco. Será que com uma montueira de wqs brasil afora teremos mais de 3 surfistas competindo na elite? O tempo já nos mostrou que nada muda. Então porque tantas etapas 4 e 5 estrelas que não dizem nada?
ResponderExcluirAbração
MB
Grande Antropólogo Marreco,
ResponderExcluirEm um só artigo dissecou o Brasileiro e descontruiu os ABOG's.
Poderia ser dissertação de Mestrado.
Forte [ ],
Lucio.
Parabéns Marreco, conseguiu miscigenar (arte nacional) com maestria, informação e atitude, dentro de uma perspectiva histórica, que ajuda a entender onde estamos e não deixar no esquecimento (essa é falha da nossa cultura) os que construiram esse caminho.
ResponderExcluirFiquei pensando como isso se reflete nos variados estilos dos surfistas brasileiros.. os braços do Águia, a energia do Dadá, a alegria de Jojó e Fabinho... eu não teria o conhecimento para discorrer sobre o assunto, mas sempre achei mais fácil identificar os brazucas nos vídeos de surfe.
Vc poderia nos presentear com uma crônica a respeito, viria bem a calhar como contraponto ao possível título mundial de Parko, um dos maiores nomes do estilo "convencional" de surfar, realmente admirável, mas um tanto asséptico?!
O cara da calça jeans que me perdoe, mas tristes trópicos é o...
Viva a mestiçagem mas, fora isso, o texto cheira a terceiromundismo recalcado.
ResponderExcluirPlanctom.
Parte II:
ResponderExcluirEnquanto isso, na terra tropical dos melhores mestiços, mais um recorde é quebrado: 50 mil mortes violentas ao ano!!!
E o Andy Irons ( sorry, periferia) acaba de descolar dois puta tubos , todos valendo mais do que 9, e mostra que esse papo de cor de pele não vale nada, o que importa é surf no pé!!!
Planctom
Parabens, Julin
ResponderExcluirSeu texto está sensacional. Muito bom saber que tais palavras foram publicadas na Hardcore.
Isso traz esperança.
abraço,
Lobo
É...como diria o gringo isso aqui é um melting pot...
ResponderExcluirO problema aqui não é falta de surf porem de investimento..
Todos sabem o quanto é complicado surfar bem.
Digo fazer a leitura correta das marolas incorretas que rodam por aqui...
O negocio é viajar.
Toda vez que vc se depara com um cara surfando bem (Dropando no critico com velocidade e fazendo manobras com pressão) é porque houve um investimento para ele viajar e surfar ondas de verdade (Sendo do bolso dele ou não)
Portanto, o que falta aqui é investimento para aquele cara que demonstra um minimo de talento para que esse quebre tabus.
Esta aí o Adriano para comprovar o que não nenhuma novidade.
Novidade mesmo seria os " empresarios" do ramo investir de verdade em que tem talento.
Hasta.
Sérgio Amaral
A ASP CONSEGUIU !
ResponderExcluirPARKO VAI SER CAMPEÃO MUNDIAL !
VI AS BATERIAIS DO ROUND 3, E POR "SORTE" PARKO NÃO PEGA NINGUÉM ATÉ AS SEMIS.
ESTE TITULO MUNDIAL FOI DECIDO EM PORTUGAL QUANDO COMETERAM O MAIOR ASSALTO A MÃO ARMADA DA HISTÓRIA DO TOUR, QUANDO DERAM A VITORIA PRA PARKO CONTRA KAI OTTON.
A ASP TÁ ME LEMBRANDO A CBF.....ALGO CHEIRA MAL.....
""VI AS BATERIAIS DO ROUND 3, E POR "SORTE" PARKO NÃO PEGA NINGUÉM ATÉ AS SEMIS.""
ResponderExcluirAmigão, é por seeding,
repare que os tops 1 e 2 sempre enfrentam os wildcards no começo do evento e só tem chance de se enfrentarem na final.
É um modo de deixar a decisão para o final e facilitar a vida dos tops, para surfarem contra o pessoal do fundão no inicio do evento.
Quanto ao post
""Somos um bando de preconceituosos abjetos e indecorosos, exatamente como os gringos que sempre acusamos de discriminação - começa em casa.""
É verdade, no dia que o brasileiro for mais educado e comprometido, ganharemos o mundo, pois opotencial que temos é magavilhoso.
maGavilhoso foi foda...
ResponderExcluirTambém torcemos e admiramos muito nossos heróis brazucas mas deixamos um alerta:
ResponderExcluirFalta cabeça.
Nosso ídolos têm muito surf e pouca inteligência.
Falta educação.
Falta noção.
Basta ver a sequência de papéis ridículos que fomos obrigados a assistir durante esse início de temporada havaiana, protagonizados por Adriano de Souza e Heitor Alves.
Que a molecada aprenda com os erros desses dois.
Aprender inglês também não faz mal pra ninguém.
ResponderExcluirSó porque é brasileiro tem que ser ignorante?
E a gente ainda tem que achar bonito?
Abaixo o pobrismo.
Falta arroz, feijão e educação.
E aí anônimo? O Gavin Gillette deve ter lido seu post né não?? Pfffff... só o que me faltava agora... teoria conspiratória pra dar título ao Joel Parkinson...
ResponderExcluirmaGavilhoso mesmo
ResponderExcluirpiada de uma propaganda de cerva
"magavia" o cara era fanho eu acho.
algumas pessoas brincam até hj falando magavilha!!!
http://www.youtube.com/user/zoorecords#grid/user/D7DD71F2E3D586E8
ResponderExcluirEntrevista historica do darcy ribeiro no roda viva. Australias e uma historia do brasil....
"que simpatia esse cara, hein!? valeu por ter postado esse vídeo. quero ler bastante desse cara, que ainda não li nada, mas, por enquanto, com essas entrevistas estou degustando um digno aperitivo.
abço"
Marreco, essas teses do Darcy, abraçadas por canhotinhos iludidos, são anedotas, não cai nessa...
ResponderExcluirum pouco de Darwin e história deixam essa porcaria no lixo. não tira de lá não.