quarta-feira, março 02, 2005

Insonia

Nessa segunda foi programado um debate para encerrar o primeiro circuito de vídeos de surfe, uma pequena mostra homenageando Pepe Cezar e Rafael Mellin, quatro dias exibindo vídeos gratuitamente, como se interessados houvesse.
Debate marcado para 7, foi adiado até as oito e meia para poder acomodar melhor os 4 malandros que lá se dignaram a aparecer, repito: quatro.
Tinha mais gente no corpo debatedor do que no outro lado, fizemos, portanto, uma roda com todos os 9 e começamos um longo papo recheado de lugares comuns.
Uma das coisas que mais intrigava era: Por que não despertava o menor interesse um evento como esse ?
Divulgação! grita o sujeito da gravata com motivos infantis.
Publicidade, a alma do negócio, naturalmente.
Mas o Circuito foi exaustivamente divulgado em todos grandes jornais do Rio e saites da grande rede de informação, retrucaram os de bermuda florida.
Nesse exato momento fui arrebatado por uma idéia assustadoramente possível dada essa era de exibicionismo que passamos - espero passe!
Pensando com meus botões do calção, percebi que hoje há uma verdadeira inversão de valores até mesmo em manifestações simples como sentar para assistir um filme de surfe.
O camarada hoje quer é ver a si próprio.
Como nesses programas de TV que apostam todas fichas na imagem do jovem de corpo saudável e cabeça de Papel, feito o marcha soldado.
A eternização da imbecilidade juvenil, ornadas por belos corpos e paisagens mais do que manjadas com enquadramentos de estagiário de produção de quinta, tudo ao som, muito bacana, de alguma banda que o estágiario ouve no Ipod - afinal, voces bem sabem, sempre haverá uma regra para confirmar a exceção.
São fotologs, com fotos e tanta cagada de regra, preferências musicais, drogas prediletas, frase cretina do Jabor plagiada de algum texto que ele leu e se apropriou, cidade onde mora, praia que frequenta, marca de roupa preferida....
Onde, essa urgência de comunicar ?
Papai não deu carinho, só mesada ?
Blogs, a auto-assessoria do mocinho moderno e da mocinha descolada, um 'meu-querido-diário' público, ao alcance de todos, com todos acontecimentos importantes da agenda: ontem foi irado! acabei de ler o livro do Chomsky e achei bárbaro!, Está em cartaz um filme iraniano imperdível, Batatinha quando nasce..., cara, voce precisa mostrar como realmente é!
Todos com essa incorrigível mania de...informar.
Minha camisa diz: Ouço Bad Religion, já fui para o Tahiti, frequento mostras de arte contemporânema em Novioruque, faço capoeira, estudo na Puc, mas não vou à aula.
Quando a próxima triagem pro BBB ?
O malandro não quer mais ver nada.
Quer é protagonizar, fazer cara feia, muque, mostrar bum-bum, mandar beijinho.
O surfe não foge disso, com os programas cada vez mais mostrando o apresentador pegando onda, o músico, a atriz.
Apresentador não pega onda na frente das câmeras, apresentador deveria se limitar a reproduzir textos razoavelmente compreensíveis e, olé!, apresentar. Músico toca, atriz atua, surfista, surfa.
A bundalização da Zona de impacto, que já nos presenteou com a série completa do Surfers Journal e uma cobertura séria do circo da ASP, envergonha até o mais fanfarrão dos 'radicais'.
Gilberto Vasconcelos previa isso, uma geração educada pelos programas da Xuxa, completamente sem identidade, no livro 'Cabaré das crianças' (Rio de Janeiro, Espaço e Tempo, 1998), não poderia dar em outra coisa, um fascínio magnético pela bunda, como aquela, monumental que a rainha dos baixinhos, beijinho, beijinho, chao, chao, exibia todas manhãs.
Faltaram os estimados nem sei quantos mil jovens surfistas ao debate, alardeados em pesquisas nas grandes revistas semanais, esses mesmos que nunca estão n'água quando o sol nasce por todo litoral carioca, esses mesmos que não compram DVD de surfe, nem revista de surfe, os milhares que infestam o fórum do saite waves, os mesmo que tem toda certeza do mundo que seremos sempre uns merdas no circuito mundial pelo mero fato de termos nascido no Brasil, um acidente geográfico.
Na imprensa, nada se falou, exceto por um artigo escondido no Globo online, que sequer dava-se ao trabalho de comentar algum dos filmes exibidos ou analisar porque seriam exibidos - apenas aproveitou o gancho e, sem perder tempo, deitou a falar da nova geração carioca de diretores.
A próxima mega-feira do hyper-mercado do surfe poderia promover um debate com os empresários perguntando porque só o Rio de janeiro, aquela província de Zampa, se renova na produção de vídeos de surfe ?
Quem sabe, na próxima vez, convidamos o Taylor Steele e cobramos um qualquer pr'essa turma?
O debate, continua...

5 comentários:

  1. Anônimo11:12 AM

    Julio,

    Porque o debate foi recheado de lugares comuns ?

    Não foi dito nada lá que seja digno de vc reproduzir aqui?

    Obrigado
    Abrs

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  2. Nosso amigo,
    lugar comun, ainda que conduzido pelos próprios debatedores, mas sobrou assunto na órbita do prato principal, vídeo de surfe.
    Aos poucos vai saindo...
    Abrazzo

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  3. Anônimo1:33 PM

    Nossa senhora, que cacetada... Excelente análise, é lamentável ver a que ponto chegou a tv e como isso está mudando a cabeça do próprio público (peraí, não era pra ser o contrário?).

    Não achei a matéria do Globo On Line ruim não. Quando li, tava com chamada na capa do jornal. Certamente vários aspectos não foram abordados, mas sempre acontece isso. Mesmo assim foi legal ver algum reconhecimento da grande mídia ao trabalho da rapaziada

    Por algum motivo que não sei explicar (já vi acontecer com várias festas e shows), aparecer no jornal não atrai público pra nada. Serve para aparecer, divulgar o nome, mas raramente isso se reflete em público.

    Pô, quando uma festinha com line up decente num lugar pequeno como a Matriz (exemplo) aparece jornal com a circulação do Globo, o lugar deveria lotar. Mas não é isso que acontece.

    Talvez porque a divisão em sessões atrapalhe. Não basta estar na sessão de cultura, tem que sublinhar que é cultura alternativa. Aí o camarada que, por qualquer motivo, não se inclui nesse rótulo, cai fora.

    A mesma coisa pode ter acontecido com a mostra, retratada de maneira menor. "Ah, vou lá ver uma molecada fazendo filmes em vídeo? Pra issso assisto o Sportv". E por conta de rótulos e abordagens reducionistas, milhões deixam de assistir um filmão como "September Sessions", que pra mim deveria passar no GNT na faixa de documentários.

    Fico triste de saber que ninguém foi na palestra. Acho que existem vários fatores para isso, como o horário, o dia. Talvez, num final de semana, atraísse mais gente.

    Ou, sem desvalorizar a iniciativa da Cavídeo, num esquema mais organizado, num cinema mesmo. Infelizmente, as pessoas se ligam nisso. Se o troço acontece num cinema, tudo bonitinho, elas vão.

    Foi mal, escrevi pacarái.

    Abs,

    Bruno.

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  4. Brunin,
    pode fazer no Odeon que a turma não vai, como não foi no Step into the liquid, aquele filme que um amigo texano apelidou de Sleep into...
    O dia, uma segunda-feira, e o horário, 7 da noite, tambem não servem de obstáculo para a total ausência da horda surfística.
    Fosse publicado na capa do Rio Show, ficaria abandonado como ficou.
    Falta isca.
    Sobra peixe.
    Vai pescar ?
    Não me chame.
    Abrazzo

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  5. Anônimo10:53 AM

    "O camarada hoje quer é ver a si próprio.
    Como nesses programas de TV que apostam todas fichas na imagem do jovem de corpo saudável e cabeça de Papel, feito o marcha soldado.
    A eternização da imbecilidade juvenil, ornadas por belos corpos e paisagens"

    No "copy & Paste", diz tudo mesmo não falando nada...É isso....

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